domingo, 22 de março de 2015

OS SACRAMENTOS NA TRADIÇÃO REFORMADA

 OS SACRAMENTOS NA TRADIÇÃO LITÚRGICA REFORMADA:

Rev. João Ricardo Ferreira de França.*

            A doutrina dos sacramentos da Igreja Presbiteriana está intimamente ligada à concepção calvinista destes mistérios da salvação. “A teologia sacramental do reformador João Calvino encontra-se principalmente nos capítulos XIV a XIX do livro IV da Instituição da Religião Cristã (Institutas) [...]”[1]. Essa tradição calvinista se faz presente nos símbolos de fé de Westminster que são padrões confessionais da Igreja Presbiteriana.
            O que é um sacramento? O Catecismo Maior responde:

Um sacramento é uma santa ordenança instituída por Cristo em sua Igreja, para significar, selar e conferir àqueles que estão no pacto da graça os benefícios da mediação de Cristo; para os fortalecer e lhes aumentar a fé e todas as mais graças, e os obrigar à obediência; para testemunhar e nutrir o seu amor e comunhão uns para com os outros, e para distingui-los dos que estão fora.[2]

1 – O BATISMO CRISTÃO:


            O sacramento do Batismo é fundamental na comunidade dos fiéis. Uma vez que ele apresenta a nova perspectiva da vida cristã; pois, este sacramento é “um sinal e selo de nos unir a si mesmo, da remissão de pecados pelo seu sangue e da regeneração pelo seu Espírito; da adoção e ressurreição para a vida eterna[3].
            a) Nossa União com Cristo apontada no Batismo:
            O nosso Catecismo tem a definição do batismo como um sinal e selo da aliança para indicar a nossa união com Cristo. Paulo nos ensina isso em Gálatas 3.27 – “porque todos quantos fostes batizados em Cristo de Cristo vos revestistes.” – então, no ato do batismo em pleno culto público é uma declaração de Deus para conosco de que pertencemos a Cristo e estamos em íntima comunhão com ele.
            b) O Batismo é um sinal e selo das bênçãos salvadoras:
            Todas as bênçãos salvadoras que carecemos são assinaladas e apontadas como uma realidade no sacramento do batismo – ele aponta para tudo aquilo que Cristo fez tais como a remissão dos pecados (Atos 22.16; Marcos 1.4; Apocalipse 1.5); a regeneração produzida pelo Espírito Santo é simbolizada pelo derramar da água do batismo (João 3.5; Tito 3.5).

            c) O Batismo é o selo da admissão na igreja de Deus:
            O catecismo ainda nos diz que este sacramento serve para que os que são batizados sejam “solenemente admitidos à Igreja visível e entram em um comprometimento público, professando pertencer inteira e unicamente ao Senhor.” (Atos 2.41)
            e) Os Sujeitos do Batismo:
             O batismo cristão deve ser ministrado aos pais bem como aos filhos. O batismo doméstico deve ser praticado na Igreja de Cristo.  O que labora para a prática do batismo infantil é o testemunho claro das Escrituras sobre  a continuação da aliança (Colossenses 2.11-12); assim, como também a evidência bíblica de batismo de famílias inteiras nas Escrituras (Atos 16.15,33-34). “Deveríamos falar em ‘batismo familiar’ em vez de ‘batismo infantil’”[4]

 

2 – A EUCARISTIA.


            A prática litúrgica na igreja integra o conceito da celebração da eucaristia. O sacramento da Santa Ceia do Senhor, como é conhecido, “é o rito basilar de nossa fé”.[5] A Eucaristia é lembrada como a proclamação visível de Deus ao mundo de sua redenção.
            Mas, o que é a Eucaristia ou Ceia do Senhor? O Catecismo Maior de Westminster na pergunta 168 nos responde:
A Ceia do Senhor é um sacramento do Novo Testamento no qual, dando-se e recebendo-se pão e vinho, conforme a instituição de Jesus Cristo, é anunciada a sua morte; e os que dignamente participam dele, alimentam-se do corpo e do sangue de Cristo para sua nutrição espiritual e crescimento na graça; têm a sua união e comunhão com ele confirmadas; testemunham e renovam a sua gratidão e consagração a Deus e o seu mútuo amor uns para com os outros, como membros do mesmo corpo místico.

            É a refeição da aliança do povo de Deus (Mateus 26.26-28) apontando para o sofrimento de Cristo e a libertação de seu povo.
            a) As concepções eucarísticas sobre a presença real de Cristo:
1. Transubstanciação: A concepção da Igreja Romana de que o pão e o vinho se transformam no corpo de Cristo literalmente.
2. Consubstanciação: A concepção luterana de que Cristo está no pão e vinho, ou sob, ao lado junto com estes elementos.
3.Concepção Memorial: A concepção zuingliana de que a Santa Ceia é um mero memorial no qual não confere benção alguma.
4. A presença real, porém espiritual: É a posição presbiteriana de que Cristo está presente na eucaristia de forma real porém verdadeira e espiritualmente.
            b) A regularidade da Eucaristia no culto público: Quantas vezes devem ocorrer a Eucaristia na celebração pública? Convencionou-se nas nossas igrejas a celebrar a Ceia do Senhor uma vez por mês, geralmente, no primeiro domingo de cada mês. Muitos procuram justificar isso associando o rito pascal, que era celebrado uma vez por ano, como padrão para ser uma vez por mês. E, historicamente sabemos que Zwínglio reduziu a freqüência da celebração da Ceia do Senhor a quatro vezes por ano – e ainda desvinculou a celebração do dia do Senhor.[6]
            Mas, estudando os dados do Novo Testamento sabemos que a Ceia do Senhor era freqüente na vida litúrgica da igreja primitiva. Em Atos 2.42 nos mostra isso de forma muito clara. “A Ceia era, portanto, celebrada regularmente. Diz também a narrativa, como de passagem, que os irmãos de Trôade, no primeiro dia da semana, estavam ‘reunidos como o fim de partir o pão’ (Atos 20.7)”.[7]
            A vida da igreja era litúrgica e sacramental. É notório que estes textos sempre apresentam o vínculo conectivo entre o “dia do senhor” e o “partir do pão”; então, a celebração deve ser feita no domingo e deve ser regular. Na primeira carta de Paulo aos Coríntios ele mostra que a eucaristia era celebrada regularmente na vida da Igreja (1ª Coríntios 10.16; 11.23-31). No capítulo 11.20 o apóstolo mostrar que ao tratar do tema da profanação da refeição pactual ele mensura a ideia que eles normalmente se reúnem para aquilo. Ele usa o negativo “não é a Ceia do Senhor que comeis”, por causa, da prática pecaminosa deles que acabava por profanar o sacramento regularmente.
            No capítulo 11.24 o conceito de memória é introduzido por Paulo seguindo a tradição de Cristo em Lucas 22.19. A palavra grega “ἀνάμνησιν.” [anamnesin] Carrega o  conceito muito amplo é mais que mera lembrança. A ideia que o conceito encerra é de “tornar presente aquilo que recorda”.[8] Podemos dizer que se trata de uma recapitulação da história da redenção que nos fornece certeza da presença verdadeira de Cristo na celebração litúrgica.

  
REFERÊNCIAS BIBLIGRÁFICAS:


1.       ALLMEN, J.J. Von. O Culto Cristão Teologia e Prática. Tradução: Dírson Glênio Vergara dos Santos. São Paulo: ASTE, 2006, p. 147.
2.       GIRAUDO, Cesare. Redescobrindo a Eucaristia. Tradução: Francisco Taborda.  São Paulo: Edições Loyola.
3.       KLEIN, Carlos Jeremias. Os Sacramentos na Tradição Reformada. São Paulo: Fonte Editorial, 2005.
4.       LUCAS, Sean Michael . O Cristão Presbiteriano – Convicções, Práticas e Histórias. Tradução: Elizabeth Gomes. São Paulo: Cultura Cristã, 2011.
5.       MAZZAROLO, Isidoro. A Eucaristia: Memorial da Nova Aliança – Continuidade e Rupturas. São Paulo: Editora Paulus, 1999.




* O Autor é Ministro da  Palavra pela Igreja Presbiteriana do Brasil. Estudou no Seminário Presbiteriano do Norte (SPN) em Recife – PE. Foi professor de línguas bíblicas (Hebraico e Grego) no Seminário Presbiteriano Fundamentalista do Brasil (SPFB) em Recife – PE. Atualmente é pastor na Primeira Igreja Presbiteriana de Piripiri – Piauí.(www.ipdepiripiri.blogspot.com.br )  É casado e tem um filho.
[1] KLEIN, Carlos Jeremias. Os Sacramentos na Tradição Reformada. São Paulo: Fonte Editorial, 2005, p.87-88.
[2] Catecismo Maior de Westminster  resposta à pergunta 162.
[3] Catecismo Maior de Westminster resposta à pergunta 165.
[4] LUCAS, Sean Michael . O Cristão Presbiteriano – Convicções, Práticas e Histórias. Tradução: Elizabeth Gomes. São Paulo: Cultura Cristã, 2011, p.83.
[5] GIRAUDO, Cesare. Redescobrindo a Eucaristia. Tradução: Francisco Taborda.  São Paulo: Edições Loyola, p.7.
[6] KLEIN, Carlos Jeremias. Os Sacramentos na Tradição Reformada. São Paulo: Fonte Editorial, 2005, p.86.
[7] ALLMEN, J.J. Von. O Culto Cristão Teologia e Prática. Tradução: Dírson Glênio Vergara dos Santos. São Paulo: ASTE, 2006, p. 147.

[8] MAZZAROLO, Isidoro. A Eucaristia: Memorial da Nova Aliança – Continuidade e Rupturas. São Paulo: Editora Paulus, 1999, p.89.

segunda-feira, 9 de março de 2015

O LÍDER CRISTÃO – O PASTOR DO SEU LAR

LÍDER CRISTÃO – O PASTOR DO SEU LAR.
Rev. João Ricardo Ferreira de França.
Salmo didático de Asafe Escutai, povo meu, a minha lei; prestai ouvidos às palavras da minha boca.  Abrirei os lábios em parábolas e publicarei enigmas dos tempos antigos. O que ouvimos e aprendemos, o que nos contaram nossos pais, não o encobriremos a seus filhos; contaremos à vindoura geração os louvores do SENHOR, e o seu poder, e as maravilhas que fez. Ele estabeleceu um testemunho em Jacó, e instituiu uma lei em Israel, e ordenou a nossos pais que os transmitissem a seus filhos, a fim de que a nova geração os conhecesse, filhos que ainda hão de nascer se levantassem e por sua vez os referissem aos seus descendentes; para que pusessem em Deus a sua confiança e não se esquecessem dos feitos de Deus, mas lhe observassem os mandamentos; e que não fossem, como seus pais, geração obstinada e rebelde, geração de coração inconstante, e cujo espírito não foi fiel a Deus.
(Salmos 78.1-8)
Introdução:
            Já temos visto a importância da liderança espiritual no lar, e vimos que o homem cristão te uma enorme responsabilidade sobre os seus ombros como homem protetor e provedor de seu lar.
            Nesta noite temos um grande desafio para cada um de nós. O desafio de pastorear o coração de nossos familiares; pois, muitos de nossos lares estão cheios de impiedade, sem santidade e compromisso com Deus. Isto porque muitos homens não assumem o seu papel no lar de sacerdotes.
            Por outro lado, enfrentamos uma crise litúrgica, pois, muitas de nossas igrejas estão sem adoradores regulares porque falta muita espiritualidade nos lares dos crentes; falta compromisso com Deus e com a sua palavra.
            A igreja precisa de homens que caminhem com Deus, que ame a sua palavra que a tornem o centro de seus lares e a base de suas famílias. É necessário que as famílias resgatem o culto doméstico, pois, como alguém já disse: “uma casa sem culto doméstico não tem alicerce e nem teto”.
            Que tipo de homem Deus quer que você seja no seu lar ou no seu futuro lar? Moças que tipo de homem vocês devem procurar para casar?
I – O LÍDER CRISTÃO DEVE TRAZER A PALAVRA DE CRISTO À SUA FAMÍLIA.
            Uma das principais dos pais em relação ao filho e a esposa é certamente trazer a Palavra de Deus à família; é instruir a sua esposa e seu filho na Palavra do Senhor. É sua responsabilidade purificar a sua mulher pela água da palavra (Efésios 5.26): “Maridos, amai vossa mulher, como também Cristo amou a igreja e a si mesmo se entregou por ela, para que a santificasse, tendo-a purificado por meio da lavagem de água pela palavra,”  - é responsabilidade ímpar dos maridos ensinarem as suas esposas a Palavra de Cristo; os homens tem essa responsabilidade como sacerdotes do lar de ensinarem pela palavra e com a palavra a vontade de Deus para as esposas.
            Também somos ensinados que, como pais, nós devemos ensinar a lei de Deus com diligência aos nossos filhos para que eles conheçam ao Senhor. (Deuteronômio 6.6-7): “Estas palavras que, hoje, te ordeno estarão no teu coração; tu as inculcarás a teus filhos, e delas falarás assentado em tua casa, e andando pelo caminho, e ao deitar-te, e ao levantar-te.
            É papel dos pais ensinarem ao seu filho o caminho da santidade e do temor a Deus, pois, devemos inculcar os preceitos de Deus aos nossos filhos! Pois, eles devem ser ensinados “na disciplina e admoestação do senhor” (Efésios  6.4).
            Nós devemos promover a religião familiar no dizer do pastor Puritano Richard Baxter. Pois, muitos homens acham que os pastores é que devem pastorear os seus lares, ensinar a Palavra de Deus as suas mulheres e filhos, todavia, conforme temos, visto esta é uma responsabilidade que recai sobre os ombros dos homens casados e não somente do Pastor. 
II – O LÍDER CRISTÃO DEVE ORAR POR SUA FAMÍLIA E COM ELA.
            Você como pastor do seu lar deve de forma clara orar por sua família e nutrir uma vida de oração com ela. Ser um homem de oração em nossos dias é um grande desafio! Somos uma geração que desaprendeu a orar; não temos mais do quarto secreto da oração.
            Paulo recebeu uma prática salutar de seus pais que era a prática da oração constante, ele manifesta esta verdade ao orar por Timóteo e pela Igreja de Deus conforme ele mesmo diz em 2 Timóteo 1.3: “Dou graças a Deus, a quem, desde os meus antepassados, sirvo com consciência pura, porque, sem cessar, me lembro de ti nas minhas orações, noite e dia.” Nós como líderes de nosso lar devemos fazer como fez Jó. 1.1-5:
Havia um homem na terra de Uz, cujo nome era Jó; homem íntegro e reto, temente a Deus e que se desviava do mal. Nasceram-lhe sete filhos e três filhas. Possuía sete mil ovelhas, três mil camelos, quinhentas juntas de bois e quinhentas jumentas; era também mui numeroso o pessoal ao seu serviço, de maneira que este homem era o maior de todos os do Oriente. Seus filhos iam às casas uns dos outros e faziam banquetes, cada um por sua vez, e mandavam convidar as suas três irmãs a comerem e beberem com eles. Decorrido o turno de dias de seus banquetes, chamava Jó a seus filhos e os santificava; levantava-se de madrugada e oferecia holocaustos segundo o número de todos eles, pois dizia: Talvez tenham pecado os meus filhos e blasfemado contra Deus em seu coração. Assim o fazia Jó continuamente.
            Aqui nós aprendemos algumas verdades importantes:
1.      Jó era um pai preocupado com a espiritualidade dos filhos: O texto nos informa que Jó procurava santificar cada filho; em outras palavras, ele procurava cuidar da alma de seus filhos como um sacerdote do lar.
2.      Ele realizava um culto a Deus com desprendimento: O patriarca levantava-se de madrugada para prestar um culto a Deus, pois, pensava que eles haviam pecado contra o senhor em seu coração; pastorar o coração dos filhos é um papel fundamental dos pais!
III – O LÍDER CRISTÃO DEVE PROCLAMAR A PALAVRA DE CRISTO PARA O SEU LAR.
            Aqui há muita negligencia neste aspecto também. Muitos homens e mulheres são sobejamente injustos com os seus pastores, dizendo que eles não a sua devida atenção ao rebanho, mas George Whitefield alerta-nos para um fato interessante que muitos líderes dos lares de nossa igreja caem na mesma desgraça: “pois, cada casa é uma pequena paróquia, cada chefe de família é como um sacerdote, cada família como um rebanho, e se qualquer um deles perece devido à negligência do líder, das mãos deste ser requerido por Deus o sangue de quem pereceu”.
            Aqui vemos que muitos pais estão negligenciando o principio básico do pastorear as suas próprias famílias e de proclamar para elas a palavra de Cristo. Não trata-se e uma pregação formal, mas do transmitir a fé do passado, observemos o que nos diz o salmista no salmo 78.1-8:
Salmo didático de Asafe Escutai, povo meu, a minha lei; prestai ouvidos às palavras da minha boca.  Abrirei os lábios em parábolas e publicarei enigmas dos tempos antigos. O que ouvimos e aprendemos, o que nos contaram nossos pais, não o encobriremos a seus filhos; contaremos à vindoura geração os louvores do SENHOR, e o seu poder, e as maravilhas que fez. Ele estabeleceu um testemunho em Jacó, e instituiu uma lei em Israel, e ordenou a nossos pais que os transmitissem a seus filhos, a fim de que a nova geração os conhecesse, filhos que ainda hão de nascer se levantassem e por sua vez os referissem aos seus descendentes; para que pusessem em Deus a sua confiança e não se esquecessem dos feitos de Deus, mas lhe observassem os mandamentos; e que não fossem, como seus pais, geração obstinada e rebelde, geração de coração inconstante, e cujo espírito não foi fiel a Deus.

            Os pais (homem e esposa) tem a responsabilidade de passar a diante toda a história da redenção que Deus manifestou ao longo da história; proclamar Cristo no lar é a maior benção que um casal cristão pode receber do seu Senhor e Salvador.




quarta-feira, 4 de março de 2015

A LEITURA E A PREGAÇÃO DA PALAVRA NA TRADIÇÃO REFORMADA

A LEITURA E A PREGAÇÃO DA PALAVRA NA TRADIÇÃO REFORMADA

Rev. João Ricardo Ferreira de França.*

            Um escritor contemporâneo diz que a “marca do culto reformado é  sua saturação das Escrituras”.[1] Ou seja, o Culto presbiteriano é eivado das Escrituras. A “adoração não deve somente ser governada pela Palavra, ela tem de estar saturada da Palavra”. [2] Isto nos leva para duas ideias importantes sobre a presença da Palavra de Deus no culto: 1) Proclamação Anagnóstica; 2) Anúncio kerygmático.

I – A PROCLAMAÇÃO ANAGNÓSTICA:


            A leitura da palavra é conhecida como proclamação anagnóstica.  O que isto significa? A palavra “anagnóstica” deriva do verbo grego “anagno,skw”[anagnoskô]  que significa “eu leio em voz alta”. Refere-se à leitura litúrgica na igreja como um ato fundamental do culto cristão. È claro que está prática a igreja cristã herdou do judaísmo conformo nos informa Lucas 4.16: “Indo para Nazaré, onde fora criado, entrou, num sábado, na sinagoga, segundo o seu costume, e levantou-se para ler.”
            Na passagem citada podemos notar a herança da sinagoga, no que respeita à proclamação anagnóstica, para a igreja cristã primitiva. Essa prática “encontramos em São Paulo a exortação a que se leiam suas cartas quando das assembléias litúrgicas”[3]. Conforme podemos comprovar na passagem de Colossenses 4.16: “E, uma vez lida esta epístola perante vós, providenciai por que seja também lida na igreja dos laodicenses; e a dos de Laodicéia, lede-a igualmente perante vós.”
            a) Lectio Continua: a pergunta que tipo de leitura deve ser lida? A primeira proposta, que tem o uso mais histórico, é a leitura continua que consiste na leitura de um livro completo das Escrituras no decorrer das celebrações litúrgicas.
            b) Lectio Selecta: consiste na seleção de passagens que escolhemos para a leitura durante o culto – isto é mais novo, e tem uma função sistemática, geralmente ligada ao tipo de pregação quer será ministrada.
            c) Quem deve ler as Escrituras na liturgia?  O nosso Catecismo Maior de Westminster nos oferece uma resposta:
156. A Palavra de Deus deve ser lida por todos?
Resposta: Embora não seja permitido a todos lerem a Palavra publicamente à congregação, contudo os homens de todas as condições têm obrigação de lê-la em particular para si mesmos e com as suas famílias; e para este fim as Santas Escrituras devem ser traduzidas das línguas originais para as línguas vulgares.

            A posição reformada que nem todos devem ler as sagradas Escrituras publicamente[4]. Isso nos leva para aquela ideia da leitura responsiva que estamos tão acostumados em nossas igrejas, é bom que saibamos que está uma prática relativamente nova e não fazia parte da tradição presbiteriana histórica.
            Em seu comentário ao Cartecismo Maior o Dr. Vos declara o seguinte:
Ler a Escritura “em público para a congregação” faz parte da condução da adoração pública de Deus e deve, portanto, ser feita apenas pelos que foram devidamente chamados para este ofício na igreja. É claro que na falta de um ministro ordenado ou licenciado os presbíteros da igreja podem indicar alguém apropriadamente para ler as Escrituras e conduzir uma reunião de oração ou reunião comunitária. O que catecismo nega é que qualquer crente em particular possa legitimamente tomar para si a condução do culto público sem que para isso seja indicado por aqueles cujo ofício é dirigir a casa de Deus.[5]

II  – ANÚNCIO KERYGMÁTICO.          

            A palavra de Deus se faz presente no culto público também por meio de sua proclamação audível. Chamamos de proclamação catequética ou anúncio kerygmático – a pregação da palavra em si.
            Não podemos falar sobre este assunto sem entendermos como a História da Igreja o encarou, ou seja, como a Igreja viu a questão da pregação fiel da palavra? No texto que lemos em  1ª Coríntios 1.18-25 Paulo valorizava a pregação oferecendo conotações dramáticas. O que é a pregação? Stott nos diz que é “a ênfase exclusiva do cristianismo” [6].
            Por onde começar a nossa peregrinação histórica da pregação? Dargan nos indica que tal procura deve ser vista no próprio cristo, pois, o “Fundador do cristianismo, pessoalmente, foi o primeiro dos seus pregadores...” [7] os evangelhos apresentam cristo como indo e “proclamando as boas-novas de Deus” (Mc. 1.14; 1.39; Mt.4.17; 4.23; 9.35).
            Somos informados pelas Escrituras que os apóstolos davam prioridade à pregação da Palavra em Atos 6.4.
            Mas, surge-nos uma questão quem deve pregar a Palavra de Deus  publicamente à congregação? O Catecismo Maior apresenta-nos uma resposta:
PERGUNTA 158: Por quem deve ser pregada a Palavra de Deus?
RESPOSTA: A Palavra de Deus deve ser pregada somente pelos que foram suficientemente dotados e devidamente aprovados e chamados para tal ofício. O Dr. Vos comentando a pergunta 158 do Catecismo Maior de Westminster lembra-nos que:
Quem não for ministro ordenado ou licenciado pode testemunhar de Cristo em particular ou em público, conforme a oportunidade o permita, mas a pregação pública oficial da Palavra na Igreja deve ser feita apenas por aqueles devidamente separados para esta obra. Claro está que a pregação da Palavra é uma obra de importância muito grande. São necessárias as qualificações apropriadas para que seja feita de maneira adequada. Há qualificações espirituais, intelectuais e educacionais sobre as quais se deve insistir para que a igreja tenha um ministério adequado. [8]

David Martyn Lloyd-Jones nos lembra algo interessante sobre este assunto:
[...] Quem deve realizar a Pregação? O primeiro princípio que gostaria de afirmar é que nem todos os crentes são destinados  a fazer isso, nem todos os homens crentes devem pregar, e de maneira alguma as mulheres! Noutras palavras, precisamos considerar o que se chama ‘pregação leiga’. Isto já vem sendo praticado de modo bastante comum há cem anos ou mais. Antes, era uma prática comparativamente rara, mas hoje é muito comum. Seria interessante examinamos a história dessa prática, mas o tempo impede de fazê-lo. Novamente, o mais interessante a ser observado é que esta mudança resultou de causas teológicas. Foi a mudança na teologia do século passado, de uma atitude reformada e calvinista para uma postura essencialmente arminiana, que provocou o aumento da pregação de leigos. A explicação dessa causa e efeito é que, em última análise, o arminianismo é não-teológico. Eis porque a maioria das denominações evangélicas  da atualidade são igualmente não-teológicas. Sendo esse o caso, não deve nos surpreender o fato de que predominem em nossos dias o ponto de vista de que a pregação está aberta a todo homem e posteriormente, a qualquer mulher. Minha asserção é que esta é uma perspectiva antibíblica sobre a pregação.[9] 
            O uso do verbo relacionado a esta função de arauto “kerussw”- keryssô – e na leitura que fazemos do Novo Testamento nós percebemos o seguinte que o uso deste verbo se aplica:
a) Apenas a Cristo ou a alguém comissionado por Deus para o ministério da pregação ( Romanos 10.15; pois, somente estes têm a autoridade divina de se apresentar publicamente para falar em nome de Deus.
b) Nos Evangelhos apenas João Batista é assim apresentado como proclamador enviado da parte de Deus(Mt 3.1: Mc. 1.4; Lc.3.3) – sendo ele um profeta do antigo pacto.
c) Jesus é apresentado como o proclamador supremo (Mt.4.17,23;9.35;11.1; Mc1.14,38,39; Lucas 4.18,19,44.8.1)
d) Os apóstolos comissionados por Jesus  (Mt.10.7,27; Mc 3.14; 6.12; 16.15,20; Lc.9.2; 12.13.).



* O autor é Ministro da Palavra pela Igreja Presbiteriana do Brasil. Formado em Teologia Reformada pelo Seminário Presbiteriano do Norte  (SPN) em Recife – PE. Foi professor de línguas bíblicas (Grego e Hebraico) no Seminário Presbiteriano Fundamentalista do Brasil (SPFB) em Recife - PE. É o fundador do Centro de Estudos Presbiteriano. Atualmente é pastor da Primeira Igreja Piripiri – PI. É casado com Géssica Araújo Soares Nascimento de França. E possui um filho Chamado de Lucas Luis Nascimento de França Contatos: E-mail: jrcalvino9@hotmail.com / jrcalvino9@gmail.com
Fones:  (89) 9930-6717 [número Tim]
[1] HYDE, Daniel R. O que é um Culto Reformado? Tradução:Josafá  Vaconcelos. Recife: Editora Os puritanos / Clire, 2012 , p.15
[2] JOHNSON, Terry L. Adoração Reformada  -  A adoração que é de Acordo com as Escrituras. Tradução: Josafá Vaconcelos. Recife: Editora os Puritanos, 2001, p.40.
[3] ALLMEN, J.J. Von. O Culto Cristão Teologia e Prática. Tradução: Dírson Glênio Vergara dos Santos. São Paulo: ASTE, 2006, p. 129.

[4] O entendimento é que apenas o Ministro da Palavra [Presbítero Docente = Pastor] é quem deve fazer a leitura Pública à congregação, pois, a leitura da palavra faz parte do ministério pastoral.
[5] VOS, Johannes Geerhardus. O Catecismo Maior de Westminster Comentado. Tradução: Marcos Vasconcelos. Recife: Os Puritanos / Clire, 2007, p.499.
[6] STOTT, John. Eu Creio na Pregação, Tradução: Gordon Chown São Paulo: Vida, 2003, p.15
[7] DARGAN, E.C. History of Preaching, p.7, vol. II In: STOTT, John. Eu Creio na Pregação, São Paulo: Vida, 2003, p.17.
[8] VOS, Johannes Geerhardus. Catecismo Maior Comentado. Tradução: Marcos Vasconcelos. Recife: Editora Os Puritanos / Clire, 2007, p.508.
[9]  LLOYD-JONES, David Martyn.  Pregação e Pregadores. Tradução: João Bentes Marques. São Paulo: Editora Fiel,  2008, p.97-98

segunda-feira, 2 de março de 2015

O HOMEM COMO PROVEDOR DO LAR

A PROVISÃO CARACTERÍSTICA DE UM LÍDER DO LAR
1ª Timóteo 5.8.
Pr. João Ricardo Ferreira de França*
Introdução:
            Na liderança familiar cristã é necessário compreendermos as características que os homens cristãos devem demonstrar neste mundo, vimos que uma das características é certamente o de ser protetor do seu lar, da sua família.
            Alinhado a esta qualidade o homem cristão deve ser antes de tudo também o provedor do seu lar. Essa característica é uma das quais todos nós temos concordância, todavia, este conceito está dia-a-dia diluindo-se pela perspectiva feminista – as mulheres hoje procuram trabalhar fora para sustentar o lar; e isto, deve-se em grande parte por causa de homens que não assumem a sua responsabilidade de sustentar e prover o lar que Deus lhe deu para chefiar.
            E a grande questão que devemos levantar nesta hora, neste momento é qual o tipo de homem Deus chama para constituir e liderar família? Que tipo de homem a minha filha deve se relacionar? Que tipo de homem o meu filho deve ser?
I – ELE DEVE SER UM HOMEM QUE AME O TRABALHO.
            A verdadeira masculinidade apresentada na Palavra de Deus é que o homem cristão deve ser alguém com disponibilidade para trabalhar. Isso não quer dizer que o homem deve ser viciado no trabalho. Nem que está pronto para casar só quando tiver um emprego que ganhe rios de dinheiro, mas que ele deve ser  alguém com a disposição diligente para o trabalho.
            A nossa sociedade diz que os nossos jovens devem se casar quando adquirirem uma condição social financeira que chegue perto da riqueza. Todavia a Palavra de Deus nos ensina algo interessante sobre isso:
10 e, na verdade, estais praticando isso mesmo para com todos os irmãos em toda a Macedônia. Contudo, vos exortamos, irmãos, a progredirdes cada vez mais
 11 e a diligenciardes por viver tranqüilamente, cuidar do que é vosso e trabalhar com as próprias mãos, como vos ordenamos;
 12 de modo que vos porteis com dignidade para com os de fora e de nada venhais a precisar.
 ( 1ª Tessalonicenses  4:10-12 ARA)
            Notamos que a perspectiva cristã, segundo o apóstolo Paulo é que o homem deve se concentrar no trabalho, e não no acumulo de renda advindo disso! Paulo mostra que os cristãos devem fazer com seus próprios esforços com suas necessidades sejam supridas sem que haja intervenção daqueles que não conhecem a Cristo para socorrê-los.
            Ser provedor não diz respeito a quantidade de dinheiro que se tem na conta bancária, mas diz respeito a suprir as necessidades da família; mesmo, que seja um dinheiro pouco, um salário mínimo, ou mesmo a condição financeira que se adquiri no dia – a riqueza as pressas não faz bem a homem algum já dizia o sábio: “Os bens que facilmente se ganham, esses diminuem, mas o que ajunta à força do trabalho terá aumento. (Provérbis 13:11 ARA)”
II – ELE DEVE UMA ÉTICA PARA O TRABALHO.
            Uma realidade que precisamos trazer para os homens cristãos, é que a Bíblia não apóia os homens preguiçosos! Porque tudo o que fazemos no trabalho o fazemos para o Senhor Jesus Cristo. Paulo nos ensina isso em Colossenses 3.23: “Tudo quanto fizerdes, fazei-o de todo o coração, como para o Senhor e não para homens, (Col 3:23 ARA)”
            A ética cristã do trabalho é que o homem esteja sempre disposto a empregar esforço no seu trabalho para suprir as necessidades de sua casa:
6 Vai ter com a formiga, ó preguiçoso, considera os seus caminhos e sê sábio.
 7 Não tendo ela chefe, nem oficial, nem comandante,
 8 no estio, prepara o seu pão, na sega, ajunta o seu mantimento.
 9 Ó preguiçoso, até quando ficarás deitado? Quando te levantarás do teu sono?
 10 Um pouco para dormir, um pouco para tosquenejar, um pouco para encruzar os braços em repouso,
 11 assim sobrevirá a tua pobreza como um ladrão, e a tua necessidade, como um homem armado.
 (Provérbios 6:6-11 ARA)
            Além dos preguiçosos existem os que são sonhadores, ou seja, homens que falam e nunca agem como homens; falam em construir, em ter , em possuir, mas não se mobilizam para realizar,  a  palavra de Deus nos alerta sobre este tipo de homem “Em todo trabalho há proveito; meras palavras, porém, levam à penúria. (Pro 14:23 ARA)”
            A Escritura nos ensina que não devemos oferecer apoio a este tipo de homem, pois, eles  não tem de fato cumprido a liderança e a masculinidade bíblica que a Palavra de Deus nos ensina. Se há homens que por preguiça dependem dos outros para sustentar suas famílias isso é uma perversão da masculinidade bíblica, por isso, devemos ser duros com quer que seja, vejamos mais uma vez o que diz a palavra do Senhor:
6 Nós vos ordenamos, irmãos, em nome do Senhor Jesus Cristo, que vos aparteis de todo irmão que ande desordenadamente e não segundo a tradição que de nós recebestes;
 7 pois vós mesmos estais cientes do modo por que vos convém imitar-nos, visto que nunca nos portamos desordenadamente entre vós,
 8 nem jamais comemos pão à custa de outrem; pelo contrário, em labor e fadiga, de noite e de dia, trabalhamos, a fim de não sermos pesados a nenhum de vós;
 9 não porque não tivéssemos esse direito, mas por termos em vista oferecer-vos exemplo em nós mesmos, para nos imitardes.
 10 Porque, quando ainda convosco, vos ordenamos isto: se alguém não quer trabalhar, também não coma.
 11 Pois, de fato, estamos informados de que, entre vós, há pessoas que andam desordenadamente, não trabalhando; antes, se intrometem na vida alheia.
 12 A elas, porém, determinamos e exortamos, no Senhor Jesus Cristo, que, trabalhando tranqüilamente, comam o seu próprio pão.
 13 E vós, irmãos, não vos canseis de fazer o bem.
(2ª Tessalonicenses 3:6-14 ARA)

            Paulo mostra-nos que aqueles que vivem “desordenadamente” (ociosoos) ou aqueles que vivem como preguiçosos (VS.6) que eles devem ser tratados com todo o rigor. Como pais devemos proteger as nossas filhas de homens deste tipo, e como pais, devemos lutar para que os nossos filhos nãos sucumbam a este tipo de comportamento ímpio e blasfemo.
            Paulo neste texto usa como exemplo ele mesmo e os outros apóstolos, pois, quando a igreja se via em dificuldades eles mesmos serviam de exemplos como trabalhadores para não serem pesados à igreja de Deus (VS.8)
            E, por fim, Paulo condena o assistencialismo, tão em voga em nosso país. Ao declarar no verso 10 que caso alguém seja preguiçoso, que não quer trabalhar também não coma!
            Aqui o apóstolo insiste que a igreja não deve tolerar os preguiçosos, os preguiçosos levam os recursos da igreja, da família e da sociedade. Paulo prontamente nos ensina que devemos ser intolerantes com este tipo de pessoa, e assim, nos ensina que o líder cristão no lar é aquele que demonstra a  sua masculinidade pela força do trabalho.



* O autor é Ministro da Palavra pela Igreja Presbiteriana do Brasil. Atualmente é pastor na Primeira Igreja Presbiteriana de Piripiri – Piauí.